domingo, dezembro 27

A beleza é uma contradição velada! (Sartre)

Beauté terá sido a palavra francesa que Sartre usou para compor esta frase? Não tenho o original em francês do seu Situations I, onde escreveu a bela frase, que em meu francês claudicante (lembrar que além de nascido francês Sartre escreveu como poucos - prosa, crítica literária, filosofia, peças teatrais etc, em sua língua) vou pensando em palavras como: contradiction e veillée. Bem, vejamos em português, que domino um pouco melhor.
Beauté [pronuncia-se botê] pode significar formosura, lindeza etc; contradiction é fácil - algo como oposição entre dois termos em uma mesma frase. Também dizemos espírito de contradição; ou aquilo que provoca contestação, é contestável, ou seja, o que possui contradição não é incontestável. Velada pode significar coberta, vigiada, véspera, serão, passar sem dormir, guarda; tem a ver com véu, também. Além de outras acepções que depois trarei para o diálogo. De qualquer modo podemos dizer a frase de Sartre - pelo menos a traduzida no Situações I - editada no Brasil, nos seguintes modos:
"A beleza é uma oposição vigiada"; "A beleza é um algo contestável vigiado"; "A beleza, por ser contestável precisa de vigília"; "A beleza só existe sob guarda, vigilância". Mas, afinal, onde isso poderá nos levar?
Sartre, ao que me consta, escreveu consequentemente, ou seja, nada de frases de efeitos só pelo espetáculo gramatical, sintático ou fraseológico. O que não nos exime do sentimento de que, em certas frases, estamos diante de um enigma. Mas podemos começar por aproximar seu dito de outro dito já popular: "A beleza se encontra nos olhos de quem a vê", ou seja, contestável, e por isso, exigindo eterna confirmação de que possui de fato a formosura que lhe imputamos.
A beleza, no dizer de Sartre, bem poderia ser uma realidade que não possui real, ou seja, que não tem certidão, constituindo-se em uma realidade a ser confirmada, guardada dos ataques dos olhares dos outros - guardada até mesmo de si próprio, tornando-se uma realidade de fé. Pois que não é verdade que as vezes nos damos conta de que estamos perguntando se o que vemos como belo de fato o é? Acontece nas melhores mentes, nas mais sinceras relações...
No dia 23 de novembro passado postei "Não te aflijas! O amor é mero acaso!", a propósito desta estranheza de amar-se o feio, transfigurando-o em bonito. Acho que Roxane, para ver Cyrano bonito deverá abstrair, de saída, seu grande nariz que enfeia irreversivelmente, suas faces, sua cabeça inteira. Isso não será problema se a beleza de Cyrano for constantemente velada... em todos os sentidos acima...
(o desenho se refere ao Cyrano histórico; nada a ver com o ficcional, criado por Edmond Rostand)  

terça-feira, dezembro 15

O espelho sem aço!

Seis da manhã. Espelho feminino em uma das mãos,  o homem olha para os vincos no rosto. Semblante sombrio. Traz na outra mão um papel amassado com algumas linhas manuscritas. Está em pé no parapeito do Viaduto do Chá. Olha para o asfalto lá embaixo e uma certeza lhe atravessa o corpo. Com método deixa cair o espelho, depois o pequeno bolo de papel, que encerram seu destino na dureza do chão. Um carro estilhaça o espelho, outro amassa o papel. O homem vira-se de costas, pula do parapeito e anda em direção ao Teatro Municipal. O rosto mais vincado ainda...

FREUD - GRUPO DE ESTUDOS

  1 – Dos livros: vamos ler a publicação das “Obras Completas de Freud", da Companhia das Letras, tradução do alemão, que por sua vez, ...