terça-feira, maio 26

Ainda assim, uma paixão!


Concordo com Sartre que disse, em algum lugar (O ser e o nada?), que o homem é uma paixão inútil. Sim, mas ainda assim, uma paixão; isso implica comover-se ou mover-se com seu objeto de paixão. Quando me vejo nesta vida nos bosques da serra do Cervo, apaixonado pelos seres daqui, tenho como certo que devo usar “paixão” incluindo seus sentidos que advém do grego pathos (doença, desgaste, morte), no entanto, colando outros sentidos negociados contemporaneamente – de esperança, cuidados, amor pela vida, consideração. Não que isso signifique alguma coisa perante a natureza, que não pode de forma alguma reconhecer meus gestos. Neste sentido, cuidar de pomar e horta ou dos bichos indefesos, é inútil; nada quer dizer para o conjunto do que é vivo – um dia o universo esfria e será o silêncio. Se a vida faz algum ruído, é por causa do homem que está aqui para checar e gravar o som. Do contrário, nenhuma manifestação de vida tem qualquer consideração para com outra vida.
O filósofo tinha razão ao dizer inútil, porque tudo que faço, seja por V., Soneca (Chefinho), Rabicho, K. Lulu, Gabi Blu, pelos pinheiros, pomar e horta, borboletas, mosquitos, formigas, cobras... pelos parentes, amigos colegas... significa sem utilidade, futuro ou necessidade. Trata-se de apenas fazer... Nem por isso sou transcendentalista, como Thoreau, tampouco behaviorista como Skinner. Se amo a natureza, não o é por romantismo, pois não a considero perfeita, nem afetuosa. É por me gostar nessa situação: pode ser, entre milhares de possibilidades, pelo suor empapando a camisa enquanto roço a foice o pomar que ficou coalhado de assa-peixes e alecrins do mato, enquanto vivi, por um ano, em Balneário de Camboriú, tentando implantar lá meu trabalho de terapeuta. De volta, há ano e pouco, temos, V. e eu, trabalhado todas as manhãs, na recuperação dos locais de comida – pomar e horta. No bosque, a vida pode se apresentar bastante ameaçada, e isso bem pode ser uma paixão, como diriam alguns psicanalistas... Anteontem uma jararaca chegou muito perto de meu pé.

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