sábado, julho 25

O Teatro Municipal de Pouso Alegre e o pousoalegrense!


Cremos ser adequado introduzir o sentido discursivo de cidade para que o advento do Teatro Municipal mostre sua complexidade e, com isso, sua colaboração na constituição do sujeito pousoalegrense. Mas não se trataria aqui de falar da cidade sob sua instância jurídica, ou política, ou territorial, e sim, colocarmo-nos uma outra forma de entender a cidade – pelo discurso – tal como nos apresenta Eni Orlandi em sua obra Cidades dos sentidos (2004). Além disso parece muito útil trazer o conceito de documento como monumento (Paul Zumthor citado por Jacques Le Goff in História e memória), onde aquele teatro passa a monumento da cultura, mas principalmente monumento-memória com o tombamento histórico de 1999. Ao aproximarmos uma teoria do discurso, tal como nos apresenta Eni Orlandi (1993, 1996, 1998), a partir de Pêcheux (1969, 1975) do sentido de documento como “monumento”, pensamos que acabaremos alcançando melhor o significado do Teatro para a cidade de Pouso Alegre.
Na teoria do discurso pechêux-orlandiana, a memória de uma cidade é discursiva, implicando nisto, que ela é construída socialmente, historicamente, a partir de condições de produção políticas, isto é, das relações de força entre os vários extratos sociais e as várias conformações do urbano – administrativas, econômicas e legislativas, principalmente. Por outro lado, o conceito de documento-monumento implica “sua utilização pelo poder (LE GOFF p. 535) como um produto da sociedade que o fabricou segundo as relações de forças que aí detinham o poder”. Parece bem claro, salvo engano, essas relações de poder, nas várias reportagens ou matérias e notas do Jornal de Pouso Alegre, dando notícia do que se fez com o teatro e da revolta de certas vozes discursivas contra os destinos que se queria dar ao prédio do teatro. Para Le Goff "importa não isolar os documentos do conjunto de monumentos de que fazem parte” (p. 538). E isso é possível, nos parece, se entendermos o conjunto de monumentos como o conjunto de memórias que formam a cidade, o sentido do que é citadino, seu território, o político e o jurídico.
Se olharmos para a cidade pela lente do discurso sua arquitetura passa a funcionar como um dispositivo de memória, e talvez possamos dizer, a partir de Orlandi, que a “cidade e [seu] território são solidários” (op. cit., p.11), e podemos acrescentar: uma parte significativa do território se apresenta na forma de edificações. Daí que o conjunto de edifícios representa muito bem o percurso da memória de uma dada cidade. Memória viva, ambivalente, deslizante, heterogênea, discursiva, então. E se “o corpo dos sujeitos e o corpo da cidade formam um” (idem), os sujeitos de uma cidade formam corpo com sua arquitetônica e com seus edifícios. E se a arquitetônica é a memória discursiva de uma cidade, uma arquitetura em particular, um edifício em particular, é um nicho de administração do discurso, ou melhor, das relações de poder que se dão no teatro citadino. A cidade e sua arquitetônica é o teatro de operações dessas transações de sentidos, dos trânsitos de sentidos por entre seus espaços físicos. Assim, podemos falar em materialidade do discurso por causa (entre outras causas), da materialidade da memória. Do cimento, dos tijolos, da ferragem e da argamassa da memória social podemos ver, de fato, os edifícios e seus significados, gravados, esculpidos, moldados a partir de um certa ordem discursiva. Ordem esta simbólico-histórica. E já podemos nos perguntar, sem adiantarmos mais, de que sujeito pouso alegrense tratamos ao tocarmos em sua memória-teatro (teatro-memória?).

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